Quem pode nos dizer com precisão como anda a evolução da nossa ciência? É muito difícil pontuar alguma coisa que não exija uma extensa coleta de dados ou então uma dedicação à busca de documentos. Porém hoje, estas dificuldades vêm sendo contornadas. Desde o surgimento dos computadores e da internet, tudo tem ficado mais fácil. Aproveitando desta tecnologia e do conjunto de dados e de acordo com o tema do XXX Congresso Brasileiro da Ciência das Plantas Daninhas a ser realizado este ano (conhecimento e tecnologia a serviço da agricultura), tentarei analisar bem superficialmente o que se passa em nossa área nos dias atuais utilizando o Google Trends® (Ferramenta do Google que permite analisar a evolução do número de pesquisas de uma palavra-chave ao longo do tempo). Sendo assim, teremos uma noção do interesse de usuários do mundo todo pelos temas da nossa área.
A ciência das plantas daninhas propriamente dita é nova se comparada a áreas como entomologia ou fitopatologia. Apesar disso é muito importante. Os maiores custos de produção em lavouras comerciais estão relacionados ao controle de plantas daninhas e as perdas que estas podem causar. Já falei um pouco sobre a origem da nossa área de estudo neste blog em um dos primeiros posts, portanto, farei uma breve introdução.
Mundialmente, os estudos iniciaram-se no fim da década de 80 e começo da década de 90. De início o controle de plantas daninhas era manual com o uso de ferramentas e quando muito pela utilização da rotação de culturas. Com a adoção das monoculturas surgiram então os herbicidas, em torno do ano de 1940 (Appleby, 2005). Os primeiros herbicidas eram compostos de substâncias como sulfato de ferro, ácido sulfúrico (sim, era utilizado) e sulfato de cobre (Klingman and Asthon, 1975). O primeiro grande salto da área se deu com a síntese do 2,4-D em 1941. A descoberta de novos herbicidas foi rápida. Por volta de 1950, já haviam 25 herbicidas registrados para uso em culturas agrícolas (Timmons, 2005). Um segundo grande passo surgiu da síntese do glyphosate (por volta de 1970) e das culturas tolerantes a esse herbicida (década de 90).
No Brasil a primeira reunião para discutir o tema se deu em 1956. Em 1963, foi criada então a Sociedade Brasileira de Herbicidas e Ervas Daninhas, hoje conhecida por Sociedade Brasileira da Ciência das Plantas Daninhas. Foi na Esalq/USP em 1960 que surgiu então o primeiro curso sobre matologia (imaginem, apenas a 56 anos atrás, ou seja, menos de uma geração completa de estudos). Dentre um dos primeiros responsáveis por ministrar essa disciplina estava o Professor Dr. Ricardo Victoria Filho, do qual muito me alegra ter tido como orientador durante meu mestrado. Este assunto está muito bem detalhado na publicação do livro “Biologia e Manejo de Plantas Daninhas” do professor Rubem Oliveira Jr., Jamil Constantin e Mirim Inoue. Disponível para download em: http://omnipax.com.br/site/?page_id=108.
Mas, e o terceiro passo? A utilização e facilidade que os herbicidas trouxeram no manejo de plantas daninhas, fizeram com que antigas práticas, como a rotação, ou a combinação de métodos de controle fossem esquecidas. Pelo uso incorreto das ferramentas disponíveis, hoje convivemos com um dos nossos maiores problemas, a resistência de plantas daninhas à herbicidas. Não bastasse isso enfrentamos cada vez mais a necessidade do aumento de produtividade de culturas, do melhor uso da terra, do exercício de práticas ecológicas, mais econômicas, etc. O mercado sabe destas necessidades e vem direcionando seus investimentos. Hoje uma multinacional prefere investir em uma cultura transgênica do que em um herbicida. Algumas, senão a maioria, estão partindo para soluções biológicas, como biopesticidas, técnicas de RNAi, etc. Vamos ver se o google nos fornece algumas pistas sobre isso.
Só para validar a ferramenta, olhe este exemplo que interessante. Comparação de busca dos três maiores times do Estado de São Paulo no google (desculpa XV). Daqui tiramos algumas conclusões. Olhe o aumento expressivo das buscas pelo Corinthians, com picos nos anos de 2012 e 2013, anos em que o time foi campeão da libertadores, mundial e paulista (acho que foram ajudados).
Uma vez explicada a ferramenta, vamos ao que interessa.
Vamos começar com a pesquisa nos termos brutos, Matologia e Weed Science (não irei pesquisar apenas por Weeds, pois teremos ai um falso positivo, ok?). Curioso, segue o gráfico da busca por Weed Science, nota-se que o número de pesquisas tem diminuído desde 2004, sendo que em 2009 essa busca de estabiliza a nível mundial. Os locais principais de onde as buscas partem são: Estados Unidos, Canadá e Índia. Uma hipotese para essa queda se deve a multidisciplinariedade que a matologia vem tomando, sendo que assunstos como genômica, proteômica, metabolômica passaram a integrar nossos estudos.
Fazendo uma pesquisa pelos termos considerados para nossa ciência, nota-se que o uso mais comum é “Planta Daninha”, seguido de “Herbologia” e por fim, quase não usado em volume suficiente “Matologia”.
Perceba agora, como existe uma queda no interesse por herbicidas ao longo dos anos e um incremento do interesse por transgênicos a partir de 2010. Note que se formos analisar esses dados anualmente não teremos a ideia de evolução aqui possibilitada. Vale ressaltar que isso ocorre para nível Brasil. Ao nível mundial estas diferenças são ainda mais expressivas. Como pode-se ver abaixo. Uma explicação para o fato se deve a liberação de inúmeras culturas geneticamente modificadas nos Estados Unidos e Austrália, fazendo com que o volume de buscas no Brasil seja menor. Como conclusão, uma coisa é certa, tem-se caído o interesse pela pesquisa de herbicidas.
E os velhos métodos de controle? O que aconteceram com eles?
Parece que ficaram no passado, ou, presentes sem evoluírem. A vantagem esmagadora do interesse por herbicidas frente a outros métodos de controle de plantas daninhas só nos mostra aquilo que já sabemos. A utilização destes agroquímicos é fácil, rentável e inevitável. O nível de busca para os outros mecanismos de controle são tão baixos, que para melhor observa-los, retirei os herbicidas do páreo. O que acontece é uma elevação do interesse por culturas de cobertura e rotação de culturas a partir de 2009. Os interesses por biopesticidas e plantio direto, permanecem constantes. É impressionante o nível de buscas para biopesticidas feitos pela Índia.
Para finalizar nossa abordagem, vamos tentar enxergar um futuro próximo. O que se passa com as novas tecnologias? Estão no interesse das pesquisa no google? O número de pesquisas por RNAi (RNA interferência) é bem maior do que aquele por alelopatia ou biopesticidas. Porém este pode estar superestimado, devido aos diversos usos do RNAi. Assim como expressivo o número de buscas por biopesticidas na Índica, é claro o domínio de pesquisas por RNAi no Japão, China e Coréia.
Como conclusão, chegamos ao fato de que ainda o maior interesse está focado nos herbicidas. Este também é relevante devido ao tanto de outros fatores que o envolvem na atualidade, tais como, resistência de plantas daninhas, contaminação ambiental, etc. Percebe-se que novos nichos estão surgindo e que a ciência está mudando, mas que ainda a lentos passos. Áreas fundamentais de pesquisa ainda não são tão priorizadas, talvez por falta de incentivos financeiros em soluções que são a longo prazo. Pode ser ainda que nós pesquisadores estamos falhando em passar tudo o que temos pesquisado para a sociedade, a famosa Extensão, ficando nossas conversas e descobertas fechadas em salas de congressos. Caso queira saber mais sobre o que esperar em um futuro próximo sugiro a leitura do artigo “The future of weed control, publicado em 2013 na Pest Management Science disponível no link : http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24339388.
Referências:
Appleby, A.P. (2005). A History of Weed Control in the United States and Canada – A Sequel. Weed Sci., 53: 762- 768.[The purpose of this article is to expand upon the historical review of weed science written by F.L. Timmons in 1970. The paper presents significant events in weed science since the 1970’s until the present such as herbicide formulation developments, legislation affecting herbicide use, as well as nontraditional weed management practices, including integrated weed management].
Klingman, G.C., and F.M. Ashton (1975). Weed Science: Principles and Practices. 2nd ed. John Wiley & Sons, New York, NY, 2nd ed. [Book summarizing weed control strategies available during the 1970’s. Although weed management practices have advanced a great deal since its publication, historical data and general weed science concepts in this book are still relevant today].
Timmons, F.L. (2005). A History of Weed Control in the United States and Canada. Weed Sci., 53: 748-761. [Summary of North American weed control practices throughout agricultural history until the late 1960’s. The original publication appeared first in Weed Science in 1970 and has been republished here in 2005, preceding the 50th anniversary of the Weed Science Society of America].
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